sábado, 25 de janeiro de 2014

Relatos amazónicos I

Chegadas a Iquitos já de noite no dia 21, foi na Quarta 22 que soubemos do Barco para o cruzamento das 3 fronteiras as 19h. Santa Rosa - Peru ; Letizia - Colômbia ; Tabatiga - Brasil, separadas pelo rio.
Pedimos a um mototaxi, entre os molhos que infestam toda a cidade, que nos levasse ao Porto. Debaixo deixa tosta que com certeza estava na escala dos 40 graus, dobramos uma esquina e entramos num portão com alguns anos e dois homens a controlar entrada.
Controladas pelos olhos de todos ali, maioritariamente homens sem camisola , descalços e a precisar de todos os banhos que nós temos precisado, entramos no barco que dizia Tabatinga .
Um formigueiro desses homens entrava e saia do barco, amontoando galinhas debaixo da escada, chapas metálicas , sacos enormes de cebolas e de seis lás mais o quê.
"Tienes que traer tu maca". Maca ? Mas que maca ?
Levou-nos ao piso superior , onde ja estavam umas redes penduradas. Redes. Tínhamos de adquirir a nossa cama para os próximos dias.
O gajo mandou-nos chegar as 16h, para termos espaço , porque aquilo ia encher.
Assim que chegamos , depois de um almoço rápido e de felizmente termos tido a ideia de comprar pão e enlatados , eu refiz a minha ideia de encher.
Os dois pisos estavam ja ocupados e meio que a custo encontramos um lugar para as duas no andar de cima. Ficamos por lá e aquilo deve ter triplicado de gente entre as 16h e as 19h.
Já não havia espaço para mais , e todos levavam grandes sacolas com mais mercadoria , desta feita pessoal. Todos bem abastecidos de comida, muitas cianças , inclusive bebés , e vendedores ambulantes que davam voltas ao barco vezes sem conta com refeições , redes, lanternas, e um etecetera de coisas potencialmente essenciais à vida no rio .

Dois moços, jogadores do Iquitos com destino ao campeonato nacional chegam e montam a rede quase encima da Rita. Juro que não via ali espaço para mais uma rede de dois. Mas eles inventaram-nos.
Digo quase encima , porque já perto da hora de saída, que se fez duas horas mais tarde que o suposto pelos carregamentos não cessarem, com manto nocturno já quedado e nós já meio a dormir , chega uma peruana e monta a sua rede literalmente encima da minha. A minha rede encostava na de um miúdo ao meu lado esquerdo , e ela conseguiu encaixar lá a coisa , bem esticada , de tal forma que depois de lá meter dois filhos, um bebé e uma chavalita, eu tive de passar a noite imóvel e dependente dos movimentos dos vizinhos .
Foi um rir tranquilo porque chegada a manhã, acordei na amazonia brava e assisti ao amanhecer mais bonito de todos.
6h da manhã e o barco agitava-se, dava a volta para para na primeira de muitas populações ribeirinhas pra deixar agua e combustível eu creio. Ditos adeuses e um homem a fazer a barba ao meu lado, foi só existir na maior paz  e apreciar a paisagem.

Um pão e um copo de leite que preferi não beber foi servido a umas 7h e à medida que o sol subia e as pessoas iam saindo dos seus casulos , as conversas começavam a cruzar-se.
Entre sorrisos , alguns acabam por ceder e meter conversa com as gringas . Como normal, julgam-nos brasileiras, e irmãs . Conhecemos Dani , vereador em Caballococha que explica que é assim, em ano de eleições as embarcações vão carregadas para as povoações .
Tem 5 filhos e duas irmãs roubadas por gringos franceses que se passearam ali assim como nós.
Ao pararmos em Pebas , com o barco logo infestado de vendedores , Dani deu-me uma mini tour pela pequena vilazinha. Arroz secava naquela que seria a pseudo avenida principal, onde ao fundo uma boa escadaria levava a uma praça com uma igreja de onde podíamos ver o formigueiro à volta do barco. Compradas umas bolachas era hora de regressar .
A senhora ao nosso lado tinha comprado um saco cheio de pães doces e ofereceu-nos
Estavam óptimos. Divorciada , estava com a filha ,Gabriela, que contava as horas para se encontrar com o pai na Colômbia.

Por esta altura , aparecem os primeiros golfinhos no rio e mais redes se amontoam no barco .
O ritmo é lento , que me parece uma forma de respeito ao que se vê em volta . Assim o barulho é menor. Pelo menos fora do barco. A terapia da paisagem é muito subtil de primeira mão , vai massajando os olhos e passando a mão no cabelo. Parece que vamos ficar ali para sempre numa forma que em nada incomoda .
Da rede para o banco , do banco para a rede , comendo o que se pode , dá-nos ba espinha uma sensação de alienação e de protecção natural daquela que os incas chamaram de pacha mama. A mãe terra aqui acolhe-nos exigindo pouco , só silêncio. Calam-se falas e pensamentos , abafam-se dispositivos eletrônicos, cancelam-se comunicações fora do barco , onde se forma uma familia temporária de gente que se apoia e abraça duas branquelas loiras

Estou na Amazónia




















Nenhum comentário:

Postar um comentário